Crónica de Santarém: "Arranque a meio gás"
Abertura da temporada na Praça de Toiros Celestino Graça, com um cartel bastante atractivo, tal como os restantes divulgados pela Associação Sector 9 para 2022.
Guardou-se um minuto de silêncio em memória de aficionados e figuras da festa que nos deixaram recentemente, destacando o Engo José Samuel Lupi, que nos deixou no passado dia 8, e Carlos Martins “Caloca”. Recordou-se também as vítimas do conflito armado na Ucrânia.
Do ponto de vista ganadero era esperado um curro de toiros da ganadaria de Veiga Teixeira, de exemplar apresentação, mas que acabou por defraudar as expectativas quanto ao comportamento demonstrado na arena.
A nível equestre tínhamos a competição entre três das mais emblemáticas dinastias toureiras, mas a verdade é que não houve nenhum triunfo a realçar, havendo apenas alguns momentos interessantes de cada um deles.
O grande destaque da tarde vai para os homens das jaquetas de ramagens, com os Amadores de Santarém e do Aposento da Moita a saírem como os triunfadores da tarde.
Abriu praça João Moura Jr com uma porta gaiola valorosa, mas que acabou por resultar pouco ajustada. A restante actuação do ginete de Monforte acabou por ir de menos a mais, sem que tenha, no entanto, chegado ao triunfo esperado. Ouviu-se música após o segundo ferro curto, sem que nada o tenha justificado, denotando o critério pouco exigente demonstrado pelo Diretor de Corrida durante toda a tarde. O destaque maior vai para o 4o curto, momento da lide em que o toiro acabou por transmitir mais no momento do ferro e a sorte saiu bem desenhada. Da “porta dos sustos” saiu o toiro Escapadito, número 756, com 540kgs, de apresentação irrepreensível, muito bem feito, musculado e bem armado. A nível de comportamento demonstrou-se sem transmissão no momento dos ferros, com um tranco suave e desinteressado atrás das montadas, evidenciando em alguns momentos, alguma dificuldade de locomoção.
Pelos forcados escalabitanos foi para a cara do 1o Francisco Cabaço. Citou com temple, a dar vantagens, carregando a sorte e recebendo o toiro de forma perfeita após uma arrancada de largo do toiro. Bem o grupo a ajudar e consumou-se ao primeiro intento a pega, tal como as restantes pegas da tarde.
Autorizada volta a arena para ambos.
O segundo “Teixeira” da tarde, de nome Grandioso 2o, número 736, com 525kgs, apresentou-se como um toiro com menor seriedade do que o seu irmão anterior, mais alto e solto de carnes, um pouco fora de tipo para o que a ganadaria tem apresentado. João Telles tentou impor o seu toureio frente a um oponente que pedia outra forma de tourear, faltando transmissão no momento do ferro, resultando em sortes pouco espectaculares e sem emoção. O toiro acabou por ter mobilidade, mas com um tranco suave e sem causar problemas de maior.
Pelo Aposento da Moita foi cara o Cabo, Leonardo Mathias, demonstrando-se bem a citar e a receber a investida do toiro e com uma boa primeira ajuda e com o grupo coeso a concretizar a pega.
Autorizada volta para ambos.
Para terceiro lugar estava sorteado o toiro Salado, número 754, com 530kgs. Um exemplo do que na gíria taurina se designa como um “tio”, rematado de carnes, com muita cara e muito sério por diante, escutando palmas aquando da sua saída por parte de alguns aficionados. Foi um exemplar exigente e reservado, que se empregava em cada arrancada que dava. João Salgueiro da Costa tentou dar importância aos compridos, como é seu apanágio, destacando-se o terceiro ferro, em que conseguiu uma reunião mais ajustada. Nos curtos tentou bregar e colocar o toiro para as sortes, destacando pela positiva o 1o pelo valor em aguentar a tarda investida do Teixeira e o 4o, de frente, com verdade, a resultar num ferro vibrante, cravado em terrenos de compromisso.
Para a cara do terceiro da tarde foi, pelo grupo da casa, o forcado Joaquim Grave. Citou com temple e com muito valor aguentou a vibrante arrancada do toiro (de fazer secar a boca!) recebendo da melhor forma e com o grupo ajudar de forma irrepreensível. A primeira grande pega da tarde!
Autorizada volta para ambos, ficando a faltar chamar novamente o forcado aos médios para uma merecida nova ovação.
Abriu a segunda parte o Universitário, número 715, com 505kgs, outro toiro bem feito, baixo e mais solto de carnes, com cara e sério por diante. Saiu reservado e distraído, investindo de forma brusca nos capotes dos bandarilheiros. Moura Jr conseguiu entender o toiro, que investiu aos arreões e sem nunca se empregar verdadeiramente, sobretudo montando o cavalo Juventus, resultando o terceiro ferro, com o toiro encostado aos curros, vibrante e a chegar às bancadas.
Martim Cosme, do Aposento da Moita, foi o forcado escolhido para ir à cara do 4o, acabou por não ter tempo para citar o toiro, visto que este veio pronto e com emoção. Mostrou-se seguro, recebeu bem o toiro e novamente bem o grupo a ajudar. Destaque também para o rabejador no remate da pega, proporcionando um bonito momento de uma sorte que tem vindo a ser menosprezada.
Volta autorizada para ambos, onde se juntaram várias crianças, pormenor a enaltecer, num momento em que é importante defender o futuro da festa.
Em 5o lugar saiu o toiro Ciganado, número 729, com 510kgs, outro exemplar bem feito, com muita cara e que saiu com mobilidade, a querer humilhar nos capotes e querer apertar atrás do cavalo no remate das sortes. Faltou-lhe, tal como aos seus irmãos, ter emoção e transmissão no momento dos ferros. Durante a lide de João Telles destacaram-se o 2o e 3o curtos, este último com um remate extraordinário, com o toiro “cozido” à barriga do cavalo. De seguida veio o final de lide comum neste cavaleiro, sacou o Ilusionista e o que se seguiu foi uma demonstração do que é “destourear”. O 4o curto saiu vibrante para o público, mas sem a verdade que o toureio exige, pela velocidade a que tudo acontece e sobretudo pela trajectória que a montada descreve, procurando o piton de saída antes do “cambio”, desvirtuando a sorte. O 5o curto foi tirado a papel químico. O público gosta, mas os aficionados do toureio a cavalo não podem ficar convencidos.
Para a cara deste toiro foi o forcado António Mello, que esteve bem a citar, mas algo precipitado a carregar a sorte, não recebendo o toiro da melhor forma, aguentando valorosamente a viagem apenas num dos pitons do toiro. Embora eficaz, o grupo não conseguiu ajudar com a mesma qualidade dos toiros anteriores.
Autorizada volta a arena para ambos.
Fechou a tarde o Repassado, número 718, com 510kgs. Talvez o toiro menos harmonioso morfologicamente da corrida, embora também com muita cara e com seriedade. Saída totalmente desinteressada e parada, sem nunca se empregar e a querer refugiar-se em tábuas com o decorrer da lide. Face à fraca condição de lide do seu oponente, Salgueiro da Costa tentou, mas não conseguiu colocar o toiro devidamente. Acabou por conceder dois fortes toques na montada, um deles quando o toiro estava fechado em tábuas, onde era previsível que a sorte não fosse resultar limpa.
Para a cara do último da tarde foi o jovem forcado Tiago Valério. No primeiro cite, com o toiro encostado à trincheira, esteve valoroso e prudente, desfazendo a pega no momento oportuno. Posteriormente, demonstrou-se muito calmo a citar o toiro, carregou no momento certo e recebeu da melhor forma a brusca investida do toiro, aguentando a dura viagem até que o grupo foi capaz de consumar a pega. Grande pega para fechar a tarde!
Autorizada volta para ambos, ficando a faltar uma nova chamada aos médios do forcado.
Destaque negativo para o tempo perdido na recolha dos dois primeiros toiros, muito por culpa do jogo de cabrestos escolhido para a função. Já há várias temporadas que é visível a incapacidade dos mesmos em se aproximar e encabrestar os toiros. Os bandarilheiros acabam por ser chamados a intervir na recolha, não dignificando em nada a imagem do Campino e levando à saturação do público nas bancadas.
Dirigiu a corrida Marco Cardoso, assessorado por José Luis Cruz e com a presença do incontornável cornetim José Henriques.
Diogo Felício