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    Crónica de Moura: "Agora para as Festas trazes duas caixinhas ao amigo"


    "Epá esse Sauvignon Blanc está fantástico, agora para as Festas trazes duas caixinhas ao amigo!". Um aperto de mão selou estas palavras e esperava vê-lo na semana seguinte, onde almoçaríamos, como até então, na Associação de Moradores da sua aldeia da Estrela. 

    Naquele espaço, em que a minha relação profissional se alinhava perfeitamente com a pessoal, trocámos impressões e as admirações que nos faziam ganhar tempo ao tempo, sem saber quanto tempo o tempo tem. Não é difuso, é fácil ler-se e concordar-se. O seu tempo sempre tinha um pouco mais de tempo para dar uma palavra a um amigo, para discutir um toiro ou saborear um vinho, motivo que nos prendia com alegria à cadeira, sem contar o tempo. O Cláudio enchia a casa quando entrava, fulminado por olhares de admiração e agradecimento pela sua presença. Nunca quis ser mais do que aquilo que a sua humildade lhe ditava, e, regido por esse valores, podendo ser muito mais, conseguia de maneira ímpar ter o condão de levar mais além o significado moral da palavra empatia. A ti, Cassiano, chateia-me brindar-te um escrito que não possas ler, e que não possamos debater o que é a justiça de um crítico, de um toiro, de uma pega, ou desta vida. 

    Os eleitos são facilmente notados pelo carisma, e quando forcados, ainda mais acentuada é essa nuance. O perfume que o albera emanava quando sentia os teus passos era diferente. Aromas de vaidade boa, de força e segurança, entrega e sangue por uma jaqueta, uma causa. A escola de valores e amizade que é apanágio da única jaqueta Real em Portugal. O tempo, que perguntou ao tempo quanto tempo o tempo tem, parou. A serpente de fogo continuará a tocar, o Real envergará a tua jaqueta até ao último dos seus dias, e nós, humanos sem tempo em correria pelo dia a dia, guardaremos na memória o sorriso fácil e brilhante do Cassiano.

    A 16 de Julho, a José de Almeida abriu portas pela primeira vez após este trágico acontecimento. Há 10 anos, eram os Amadores de Montemor a pisar este albero escuro após o fatídico desaparecimento de José Maria Cortes. Data forte, intensa, mistificada pela incerteza da salvação, antecipada por uma procissão em Honra de Nossa Senhora do Carmo, num dia de emoções claramente cinzentas. Mas o povo deu o sim, à empresa, à data e ao Cassiano, enchendo por completo as bancadas para uma homenagem justa ao Homem e ao Forcado, na sua praça.

    Felizmente foi nas pegas que o público se despiu de Festa e silenciou para apreciar, tributar e respeitar cada forcado que citou um Toiro na noite de 16 de Julho. 
    Num momento de tão carregado simbolismo, José Maria Caeiro (GFA Évora,primeira tentativa), Valter Rico (Real de Moura, segunda tentativa), Miguel Direito (GFA Évora, terceira tentativa), Rui Ameixa (Real de Moura, primeira tentativa), Ricardo Sousa (GFA Évora, segunda tentativa) e Gonçalo Caeiro (Real de Moura, segunda tentativa) foram atingidos pela grandeza, emoção e entrega nesta noite de pegas com um simbolismo muito especial. A responsabilidade e compromisso com que todos bateram palmas aos seus toiros foi intensa e determinante a superar as dificuldades que o curro dos Montezes apresentou. Rui Ameixa do Real de Moura venceria o prémio em disputa pela melhor pega, e via o seu Grupo ser coroado como o melhor em Praça. Sem favores e com a grandeza que lhe reconhecemos, Valter Rico entregou a José Maria Caeiro esse troféu, que denotou um empenho e liderança salutar neste seu início de funções como Cabo dos Amadores de Évora.

    Dos Montezes, terras "baleizoeiras" com tanta história taurina, viajou até Moura um curro com idade (alguns exemplares perto dos seis anos), variado em capas, apresentação justa ao evento e várias matizes a decifrar, umas mais interessantes que outras. 

    António Ribeiro Telles soube estar competente diante um lote difícil. O seu primeiro, um melocotón de estrutura pequena, baixo e rematado, morrilho proeminente, foi um toiro sem selo e sem codícia, limitando quanto a força e disponibilidade. Sem alardes de bom toureio, cumpriu com a ferragem da ordem de forma discreta. O quarto da ordem, de maior talha mas menor beleza, mediu e esperou quanto quis, sem vontade de abandonar redutos onde sentia conforto. Várias passagens em falso, faltando Toiro ou faltando terrenos mais hostis, não houve comunhão para uma lide de destaque, com ressalva para o útlimo curto com que honrosamente se despediu da afición de Moura.

    O segundo foi o Toiro da corrida. Para além de bonito e bem apresentado, foi um Toiro disponível, com raça e com som, que perseguia sem limite e que numa fase inicial se arrancou com pata e sem problemas de qualquer terreno, mantendo o comportamento no remate das sorte. João Moura Júnior soube aproveitar o público que esteve consigo durante a noite, e pese embora a ausência de rigor das primeiras jurisdições, construiu uma actuação aplaudida na forma vibrante como rematou as sortes. O quinto, menos disponível e mais nobre, não apresentou dificuldades suficientes às boas montadas do cavaleiro de Monforte. O eco com o público foi facilmente atingido quando montando o Neco, entrou com força pelos terrenos do Toiro e deixou dois assinaláveis curtos, aclamando para si a obra com mais interesse da noite para o público.

    Andrés Romero completava a terna de cavaleiros. Primeiramente enfrentou um Condessa de Sobral que não permitia descuidos nem falta de ortodoxia, pedindo ligação e capacidade lutadora. Sem grandes momentos de Toureio apreciado, conseguiu suplantar as dificuldades e estar diligente. A encerrar a noite conseguiu alavancar-se moralmente e chegar ao público com mais força, fruto de quiebros e vontade de agradar. Terminou melhor do que começou, com as sortes finais a reunirem maior compromisso do que o início da fase de curtos. 

    Numa corrida dirigida por Agostinho Borges, foi, para além de uma bonita homenagem e minuto de silêncio nas cortesias, descerrada uma placa em memória de Cláudio Pereira, Cassiano. Este meu escrito, é também de reconforto, memória e amizade para aqueles que partilharam um bocadinho da sua vida com o Cassiano. 

    Até sempre,

    Pedro Guerreiro